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Mão de obra qualificada, falar mais de um idioma e oferta de empregos contribuem para contratação de refugiados no setor no Brasil; mais de 90% de refugiados que vivem regularizados pelo governo brasileiro são da Venezuela

Por Gabriel Lacerda

Visando qualificar o imigrante para o mercado de trabalho no setor de bares e restaurantes, a Abrasel no Paraná e a OIM criaram a Academia Abrasel. Em sua 12ª turma, o projeto atendeu 15 imigrantes vindos da Venezuela, Cuba e Haiti


Chegar em uma cozinha antes do horário do restaurante abrir, preparar os alimentos, vasilhames. Verificar estoque, receber o time que vai chegando aos poucos e fazer a primeira reunião do dia. Pouco antes da casa abrir, Gonzalo inicia contente o preparo dos alimentos até os clientes chegarem no restaurante localizado na cidade de Porto Alegre, capital gaúcha. Mas nem sempre a rotina de chef foi assim.

Ele é um dos mais de 75 mil refugiados, de acordo com o último relatório do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) que vieram para o Brasil em busca de uma vida melhor devido aos problemas vividos no país de origem.

Há 6 anos, Gonzalo, após ser demitido, saiu da Venezuela por causa da crise vivida no país e entrou no Brasil por Roraima, onde abriu seu negócio vendendo comidas venezuelanas para os companheiros de país e para alguns brasileiros. O empreendedorismo não deu certo e mais uma vez Gonzalo ficou sem emprego.

A história de Gonzalo Humberto começou a mudar quando ele, que já tinha experiência no setor de alimentação fora do lar e hotelaria, participou de um projeto nacional que visava empregar refugiados no país, então o cozinheiro foi selecionado e mudou para Porto Alegre.

“Meu país estava passando por momentos muito difíceis e o local que eu trabalhava faliu, mandou todos embora. Vim sozinho para o Brasil, escolhi aqui, pois era mais perto da fronteira e sempre ouvimos falar muito bem. Eu vim sozinho, deixei minha esposa e meus quatro filhos para trás. Foi um ano muito ruim no Brasil, eu procurei emprego em vários estados, como Bahia, São Paulo e Rio, mas não achei”, relata o chef de cozinha.

Hoje, já com a família toda no Brasil e regularizada como cidadãos legais, Gonzalo integra os 54 mil refugiados regularizados no país, segundo o Conare, e está à frente da cozinha do restaurante Grammo Brasil, especializado em comida saudável e também do projeto Jogo Comida de Rua, que ele lidera.

“A gastronomia brasileira é muito diferente. Na Venezuela, colocávamos no prato um carboidrato, o arroz, algum vegetal, cenoura ou milho, e proteína. Aqui, quando eu cheguei e vi o prato de comida das pessoas foi um susto enorme: arroz, farinha, batata frita, legumes, carne, feijoada e muitas coisas. Por isso, fui estudar e aprender o que brasileiro gosta de comer”, explica o chef. “Hoje conseguimos nos regularizar e ter uma boa vida aqui”, acrescenta.

De portas abertas

Em relação ao mercado de trabalho, o imigrante refugiado encontra muitas opções, porém, muitas vezes, são postos de empregos considerados precários.

“Existe uma precarização do trabalho do imigrante mundialmente. Eles tendem, geralmente, a assumir postos de trabalhos desvalorizados, sofrem xenofobia, muitas vezes não tem seus direitos trabalhistas respeitados. Existem vagas no mercado, mas elas, em sua maioria, são precárias”, explica a co-fundadora do Instituto I-MiGRa, Rebecca Almeida.

Para ela, o emigrante encontra uma opção viável ao trabalhar no setor de alimentação fora do lar. “Para o imigrante, uma das principais dificuldades é o idioma. Quando chega alguém no Brasil que fala espanhol, francês, inglês, etc ele consegue assumir vagas no setor de serviços, em bares e restaurantes, hotéis para poder receber turistas”, explica.

Outra saída dos emigrantes refugiados que chegam ao Brasil, apontada pelo I-MiGRa, é o empreendedorismo.

“Nosso país possui muita diversidade gastronômica, muitos solicitantes de refúgio buscam alimentos de sua terra natal, abrem um MEI, se estiverem regularizados, e vendem aqui, como as arepas, esfirra árabe. Eles fazem da sua cultura uma forma de geração de renda por meio do empreendedorismo” relata a co-fundadora do Instituto, Rebeca Almeida.

Com apenas 17 anos de idade, Yousef Alaji saiu da Síria direto para a capital mineira para fugir da guerra enfrentada no país árabe. Sem saber falar português, sem emprego e acompanhado da mãe e do irmão, o jovem José, nome aportuguesado que ele usa, começou pedindo emprego nos comércios do centro de Belo Horizonte, mas não obteve sucesso.

“Eu não sabia nem falar ‘oi’ em português, vim para cá, pois alguns parentes já estiveram aqui e era o único estado que eu conhecia no Brasil. Não dá para viver com guerra e não ter certeza do futuro, precisava arriscar”, conta o empresário sírio, hoje, com 24 anos e um dos sócios à frente do Síria Gourmet.

A região central de Belo Horizonte é marcada pelos comércios populares, shoppings e por construções grandiosas, como o Santuário de São José, local que ajudou José a se estabelecer em BH.

“Eu vi uma construção grande, parecia um castelo e fui pedir ajuda. Chegando lá, um padre me atendeu e me ensinou a falar português, a pagar aluguel, a usar o dinheiro brasileiro, a cozinhar, ele me ajudou a me inserir e tudo que precisava para sobreviver em um novo país”, relata José.

“Fiz muitas amizades por lá e sempre gostei de cozinhar. Um dia, um amigo me contou que tinha um imóvel disponível para alugar perto do Santuário e se poderíamos vender comida síria por lá. Eu achei a ideia legal e começamos o negócio”, conta.

“A gente importa alguns insumos, trabalha com delivery e presencial. Desde então, é a fonte de renda da minha família e um pedaço da minha cultura em terras mineiras”, completa o empresário.

Quem chega?

Segundo o relatório do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) e da UNHCR ACNUR Brasil, agência da ONU para Refugiados, de 2016 a 2021, as nacionalidades dos refugiados que mais chegaram ao Brasil e tiveram seu pedido aceito pelo Governo brasileiro são de países como a Venezuela (91%), Síria (3,9%) e do Congo (1,2%).

Ainda segundo o estudo, mais da metade dos pedidos são para residência em unidades federativas do norte do país e Roraima sozinha representa 55% dos pedidos. Para o empresário e presidente da Abrasel em Roraima, Bruno Dantas, os venezuelanos têm encontrado oportunidades e ajudado o setor de alimentação fora do lar com a falta de mão de obra.

“Acredito que entre 20-30% de toda mão de obra de bares, restaurantes e hotelaria em Roraima sejam da Venezuela. Muitos deles são muito qualificados e estão suprindo a falta de pessoal para preencher as vagas”, explica.

“Eles falam inglês e espanhol e estão aprendendo português, o que é proveitoso para os estabelecimentos. Além de ser uma atitude inclusiva, que evidencia boas práticas de responsabilidade social”, finaliza.

Capacitação para imigrantes

Visando qualificar o imigrante para o mercado de trabalho no setor de bares e restaurantes, a Abrasel no Paraná e a Organização Internacional de Migrações
(OIM) criou a Academia Abrasel. Em sua 12ª turma, o projeto atendeu 15 imigrantes vindos da Venezuela, Cuba e Haiti.

De acordo com o diretor executivo da Abrasel no Paraná, Luciano Bartolomeu, são fornecidos aos participantes uniforme, vale-transporte e todo material necessário para as aulas, como instrumentos de cozinha e insumos. Além disso, a grande maioria já sai com emprego garantido nos restaurantes presentes em Curitiba, PR.

Para o aluno haitiano, Soinise Pierre, o curso foi uma oportunidade para poder se qualificar e conseguir melhor qualidade de vida no Brasil.

“Estou aqui há seis anos e procurei participar do curso para conquistar mais oportunidades. Vim para buscar uma vida melhor e esses projetos vão me ajudar a mudar minha vida no Brasil. Estou feliz com a oportunidade e ansioso para começar a aplicar o que aprendi”, explica o recém-formado no curso.

Você sabia?

Segundo o relatório do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) e da UNHCR ACNUR Brasil, agência da ONU para Refugiados, de 2016 a 2021 as nacionalidades dos refugiados que mais chegaram ao Brasil e tiveram seu pedido aceito pelo Governo brasileiro venezuelanos (91%), sírios (3,9%) e congoleses (1,2%).

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